miércoles, noviembre 10, 2004

fantasmas


Bateram à porta ─não abriste
Estavas a convocar nesse instante a blancura
Dos dados por lançar e o corvo do sr. poe mais
O maléfico negrume dos mares de melville e
Os passos em redor do andarilho etíope e
As mulheres da patagónia que estão sentadas
Ao fim da tarde
À beira de insondáveis glaciares


Seguias absorto o percurso daquele que comprava
Revistas tabaco souvenirs e via os comboios
Sumirme-se na gare de munique −mais a rua onde
Te encontro e te perco −rapaz
A quem se esqueceram de dizer que tinha um corpo
De papel bom para amachucar com os dentes


É verdade −bateram à porta
Mas não podias abrir
Nesta casa só sobrevive a memoria turva
Dos poemas amados −mais ningém mais nada
Além da parede de lodo e de caixa de sapatos
Cheia de sílabas preciosas −e uma mesa pequena
Com um albatros empalhado para te vigiar a alma

A um canto da sala o cigarro continua a arder
Na ponta dos dedos do teu retrato escondido
Atrás do sofá –virado para a parede
Como tu
Coberto de bolor de sustos e de aborrecimento


Fantasmas de Al Berto no livro HORTO DE INCÊNDIO publicado por Assírio&Alvim.
Lisboa 2000